Carbono Neutro Idesam incentiva atividades econômicas paralelas na RDS do Uatumã

[:pb]Os benefícios econômicos foram essenciais para uma mudança de pensamento dos moradores da reserva em relação ao Sistema Agroflorestal.

 

Por Henrique Saunier
Imagem: Arquivo Idesam
Edição: Samuel Simões

 

Quando o Idesam iniciou seu trabalho na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, em 2008, cerca de 300 famílias distribuídas pelas 20 comunidades da reserva operavam em um sistema econômico baseado majoritariamente na produção agrícola com derrubada e queima de floresta. Por meio do Programa Carbono Neutro (PCN), o Idesam tem ajudado a fomentar, entre as famílias locais, uma agricultura mais sustentável e com menos emissão de carbono. Ainda mais: essa nova relação dos comunitários com a floresta tem contribuído com o desenvolvimento de economias paralelas na reserva, como o turismo e a produção de mudas, frutas e óleos.

Jatapu e Caribi são exemplos de comunidades baseadas principalmente no agroextrativismo – mais especificamente a agricultura de subsistência, a pesca e o extrativismo florestal. A agricultura responde como atividade produtiva mais rentável dessas comunidades, com especial importância para a subsistência.

No entanto, com os resultados obtidos pelos Sistemas Agroflorestais (SAFs) implantados, outras atividades passaram a ser mais visadas, gerando renda e novas oportunidades. Ações de turismo de base comunitária e a visitação educacional aos viveiros de mudas são algumas das atividades fomentadas indiretamente pelas ações do Programa Carbono Neutro.

Técnico agrícola do Programa Carbono Neutro, Jefferson Araújo acompanha de perto esse cenário e comemora algumas conquistas percebidas na vida dos comunitários, como o aumento no poder de compra e uma percepção maior de atividades que podem gerar renda sem prejudicar o meio ambiente.  O orgulho dos comunitários em mostrar sua nova forma de plantar e colher superou até mesmo o medo do ‘mau-olhado’. Pelo menos três comunitários já exploram financeiramente a visitação turística nos seus SAFs.

“O turismo ecológico começou quase que de forma automática com essas pessoas”, destaca Jefferson, citando o exemplo do comunitário Ourimar Sicsú, que, por conta própria, elaborou um roteiro de visitação à sua comunidade.

“Percebo até certo deslumbre no olhar de alguns comunitários, pois eles se dão conta de que existe uma forma sustentável de preservar a Amazônia. Vejo isso como um grande potencial a ser ainda mais explorado. Ao longo do tempo, fomos percebendo que eles próprios entenderam o potencial do turismo e de se ter uma produção de mudas de melhor qualidade”, enfatiza o técnico.

Durante as atividades, os turistas podem participar ainda do plantio de mudas florestais, tudo orientado pelos comunitários, que periodicamente também recebem visitantes de escolas e universidades de outras regiões do país.

Viveiros de mudas

Quando foi criado, em 2010, o Programa Carbono Neutro encontrou, de cara, um desafio: ninguém produzia ou vendia mudas na reserva; a solução foi comprá-las em outro município e levá-las até os locais de plantio, passando por estradas e rios.

A situação hoje é bem diferente, quatro viveiros comunitários estão instalados na reserva e conseguem superar a demanda total do Programa Carbono Neutro – que ao longo dos anos também cresceu e irá plantar cerca de 20 mil unidades em 2019.

A produção de mudas se tornou uma fonte de renda a mais. E não apenas para as famílias que investiram nos viveiros, uma vez que eles contratam outros comunitários para ajudar na produção, gerando mais postos de trabalho.

Óleos

Aliado ao conhecimento tradicional, as comunidades precisam cumprir regras para o uso múltiplo de diferentes produtos florestais não madeireiros na RDS do Uatumã, como galhos, folhas, frutos, sementes, cipós e exudatos do tronco, como a Copaíba. Atualmente, pelo menos cinco comunidades da região trabalham com a extração e comercialização de andiroba, além de cinco famílias que trabalham com a copaíba, que possui forte potencial por toda a área da reserva.

As comunidades sempre tiveram a comercialização de produtos não-madeireiros como eixo de sobrevivência, sendo que a produção de andiroba atende mais a demanda interna dos moradores da reserva. Já a copaíba avança para outros mercados externos, já que é comercializada para empresas de Manaus.

Os óleos chegam a custar entre R$ 30 e R$ 40 o litro, e dividem o espaço no comércio local também com o breu, que encontrou mercado no município de Itapiranga.

Resultados atraem novas famílias

Os benefícios econômicos foram essenciais para uma mudança de pensamento dos moradores da reserva em relação ao Sistema Agroflorestal.

Logo no início do programa, Araújo aponta a dificuldade em conseguir mudas de qualidade e a baixa aceitação cultural das pessoas com relação ao plantio dos SAFs. Agora, na última expedição do Idesam à reserva, realizada em julho, pelo menos 20 famílias se mostraram interessadas em implantar o sistema.

Esse maior interesse pode ter crescido pelo fato dos moradores enxergarem de maneira prática os resultados dos SAFs. Para se ter uma ideia, um dos comunitários, Aldemir Queiroz, paralelamente ao PCN, conseguiu fechar um contrato para começar a vender camu-camu, com uma produção que rendeu três toneladas, no ano passado.

“A mão de obra do plantio toda é da reserva, não se traz ninguém de fora. Isso acaba levando mais autonomia para eles, aumentando o poder aquisitivo, a possibilidade de comprar um produto, o que movimenta bastante o comércio local”, destaca Jefferson Araújo.

Morador local desde 1979, Claudomiro Gomes, o Cacá, atua como agente ambiental educador e mantém uma área onde cultiva andiroba, açaí, cacau, banana e castanha. Além do resultado positivo do SAF comunitário, Cacá também comemora os benefícios econômicos trazidos por uma pousada instalada na sua comunidade e reforça a importância da participação dos jovens.

“Trabalhamos muito essa questão com o grupo de jovens e percebemos o interesse deles em implantar um SAF. Precisamos dos jovens, por que eles que são o futuro e vão tomar conta disso tudo”, completa Cacá.

De acordo com o Diretor Técnico do Idesam, Carlos Koury, o Programa Carbono Neutro já foi pensado para trazer impactos positivos além da recuperação e conservação das florestas, visando à implementação de uma nova economia na comunidade, a partir da compensação de emissões do Idesam e outras instituições.

Para Koury, os resultados no interior ultrapassam os beneficiários diretos dos sistemas agroflorestais implantados, pois atingem ainda outros comunitários com a coleta de sementes, produção de mudas, prestação de serviços e logística e depois na produção e comercialização de produtos agroextrativistas derivados dos SAFs implantados.

“Com o tempo do projeto estabelecido na RDS do Uatumã, percebemos o crescente interesse dos moradores da região em fazer parte do Carbono Neutro. Nos que já fazem parte do Programa, vemos uma nova postura de maior reflexão sobre o plantio, sua condução e seus resultados. Quanto mais pessoas querendo compensar suas emissões, mais famílias poderão fazer parte do Carbono Neutro”, salienta Koury.

Pesca esportiva

Além do turismo de base comunitária e o turismo ecológico/científico, que se encontram em construção na reserva, a pesca esportiva é outra modalidade da atividade que está melhor estruturada na RDS. A prática existe há muitos anos, mas ganhou reforço com maior organização dos comunitários e apoio do Idesam no estabelecimento das regras de utilização da reserva com esse fim.

Entre as regras elaboradas em conjunto com os comunitários, estão a proibição de transportar peixes para fora dos limites da RDS e respeitar o período para a realização da prática, que vai de agosto a janeiro.

Um dos que apostaram no segmento foi João Paulo Nobre, que além das suítes, oferece toda a estrutura necessária para a pesca, com direito a ‘piloteiro’, condutores turísticos, passeios, refeições e translado até a Pousada Uatumã Ecofishing.

Nobre atua há mais de 14 anos no turismo regional, mas foi há quatro anos que ele decidiu aproveitar as potencialidades da reserva em um negócio próprio. O empresário acredita que trabalhos de organizações não governamentais como o Idesam e a FAS trazem muitos benefícios indiretos para as comunidades, que atualmente abrigam nove pousadas além de outras quatro em construção.

“Pude perceber que pessoas que participaram de oficinas de guias de turismo e camareiras muitas já estão empregadas. Não estaríamos nesse estágio se não fosse o apoio dessas instituições e tudo isso ajuda a movimentar a economia local e aumenta o poder de compra do ribeirinho”, afirma Nobre.

Cerca de 90% dos clientes da pousada são da região Sudeste e Centro-Oeste, que se concentram basicamente na época de temporada de pesca. “Já pensamos até em um projeto de SPA aqui na reserva. A gente precisa descobrir outras atividades mais atrativas para trazer o turista o ano todo”, reforça o empresário.[:en]The economic benefits were key for locals to rethink their opinion on Agroforestry Systems.

 

By Henrique Saunier
Translated by Felipe Sá
Photo: Idesam
Edited by Samuel Simões

 

When Idesam began its work in the Uatumã Sustainable Development Reserve (RDS, in Portuguese) back in 2008, around 300 families from the 20 communities spread throughout the Reserve had an economic system based on agricultural production with forest felling and burning. With the Carbon Neutral Program (PCN, in Portuguese), Idesam has been helping to foster, among local families, a more sustainable and lower carbon-emitting agriculture. In addition to that: this new relationship between them and the forest has led to the development of parallel economies inside the Reserve, such as tourism and the production of seedlings, fruits and oils.

Jatapu and Caribi are examples of communities based mainly on agroextractivism – more specifically subsistence farming, fishing, and forest extractivism. Agriculture is the most profitable productive activity of these communities, with particular emphasis on subsistence.

However, with the results from the Agroforestry Systems (SAFs, in Portuguese) that were implemented, other activities became more targeted, generating income and new opportunities. Community-based tourism and educational visits to the seedling nurseries are some of the activities indirectly boosted by Carbon Neutral Program’s actions.

Jefferson Araújo, agriculture expert from PCN, closely follows this evolution and celebrates some of the achievements already noticed in the life of those who live in the communities, as purchase power increase and a higher perception of activities that can generate income without harming the environment.  The pride of the locals in showing their new way of cultivating even overcame the fear of the ‘evil-eye’. At least three people already financially explore tourism in their SAFs.

“Ecological tourism almost started automatically with these people”, highlights Jefferson, mentioning the example of Ourimar Sicsú who, alone, elaborated a visiting guide to his community.

“I can even notice a sparkle in the eye of some locals, because they realize that there is a sustainable way to preserve the Amazon. I see this as a great potential to be explored. With time, we saw that they understood by themselves the potential for tourism and for the production of better quality seedlings”, the expert emphasizes.

During the activities, tourists can take part in the forest seedlings planting, all with the guidance of community members, who periodically also welcome schools and universities from different regions of the country.

Seedling nurseries

When the Carbon Neutral Program was created in 2010 it faced a challenge: no one produced or sold seedlings inside the Reserve; the solution was to buy them from another municipality and then take them to the planting sites, crossing roads and rivers.

The situation nowadays is quite different, four community nurseries are now installed inside the Reserve and they can overcome the entire demand from Carbon Neutral Program – which also grew through the years and will plant 20,000 units in 2019.

Seedlings production became an additional source of income. And not only for the families that invested in the nurseries, since they hire other community members to help in the production, creating more jobs.

Oils

Linked to their traditional knowledge, the communities need to comply with rules for the multiple use of different non-timber forest products in the Uatumã RDS, such as branches, leaves, fruits, seeds, vines and trunk exudates, such as Copaíba. In the region today, at least five communities work extracting and trading Andiroba, besides five families that work with Copaíba, which has great potential all over the Reserve.

Community members have always had the commercialization of non-timber products as part of their lives, and the production of Andiroba usually meets their own demand, from inside the Reserve. Copaíba, on the other hand, leaves the Reserve, since it is sold to companies from Manaus.

The oils get to cost between BRL 30.00 and BRL 40.00 a liter, and they also share the space in the local market with the pitch (breu, in Portuguese), which found consumers in Itapiranga.

Results engage new families

The economic benefits were key for locals to rethink their opinion on Agroforestry Systems.

Araújo tells that, at first, it was difficult to get good quality seedlings and there wasn’t high cultural acceptance of the people in planting the SAFs. But now, in the last expedition Idesam made to the Reserve in July, at least 20 families were interested in implementing the system.

This increased interest may have been fueled by the fact that residents were able to see the results from the SAFs in a practical way. To have a better ideia, one of the community members, Aldemir Queiroz, in parallel with PCN could close a deal to start selling camu-camu, which production yielded three tons last year.

“The plantings’ workforce is entirely from the Reserve, no one is brought from outside. This ends up giving them more autonomy, increasing their purchase power, the possibility of buying a product, what greatly drives the local commerce”, highlights Jefferson Araújo.

Resident since 1979, Claudomiro Gomes, who is also known as Cacá, acts as an environmental agent educator and maintains an area where he cultivates Andiroba, Açaí, Cacau, Banana and chestnuts. Beyond the positive results of the community SAF, Cacá also celebrates the economic benefits brought by a lodge located in his community and he reinforces the importance of the youth participation.

“We work hard on this issue with young people and we noticed their interest in implementing a SAF. We need the young, because they are the future and will soon be responsible of taking care of it all”, adds Cacá.

According to Idesam’s Technical Director, Carlos Koury, the Carbon Neutral Program was thought to bring positive impacts in addition to the recovery and protection of the forests, aiming to implement a new economy in the community, from Idesam’s and other institutions’ carbon offsettings.

For Koury, the results surpass the direct beneficiaries where agroforestry systems are implemented, since they reach other community members with different activities such as seed collection, seedlings production, provision of services and logistics and also later with the production and selling of agroextractivist products from the SAFs.

“With time, we notice a growing interest of people from the region in being part of Carbon Neutral. Those who are already part of the Program, show a new attitude of greater reflection on the plantings, their conduction and results. The more people wanting to offset their emissions, the more families will be able to join Carbon Neutral ”, says Koury.

Sport fishing

Beyond community-based and ecological/scientific tourism, which are under construction in the Reserve, sport fishing is another activity that is better structured in the RDS. It is already a traditional practice, and has been reinforced with greater community organization and support from Idesam in establishing the rules for the use of the Reserve for this purpose.

Among the rules that were developed with community members are: the prohibition of transporting fish out of the RDS’ limits and the respect for the period defined for the practice – which is from August to January.

João Paulo Nobre is one of those who bet on the segment. In addition to the rooms, he offers all the structure required for fishing, such as a boat pilot, tourist guides, tours, meals and transfer to Uatumã Ecofishing Lodge.

Nobre has over fourteen years of experience in regional tourism, but it was only four years ago when he decided to embrace the potentials the Reserve has to offer in a business of his own. The entrepreneur believes that the work that is carried out by non-governmental organizations like Idesam and FAS bring countless indirect benefits to the communities, where currently nine lodges are run and other four are being built.

“I could see that many of those who participated in the tourist guides and chambermaids workshops are already employed. We wouldn’t be at this stage if it wasn’t for the support these institutions give. All this helps developing the local economy, increasing the purchase power of the riverside people”, Nobre says.

Around 90% of the lodge’s clients are from the Southeast and Center-West regions, who come mainly during fishing season. “We even thought of a spa project here in the Reserve. We need to find out more attractive activities to bring the tourist all year-round”, the entrepreneur says.

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