AGM lança estudo com diagnóstico da cadeia produtiva do guaraná mauesense

[:pb]Coordenada pelo Idesam, a Aliança Guaraná de Maués levantou dados com diversos agentes da cadeia produtiva do fruto-símbolo do município amazonense  

 

Texto e foto por Henrique Saunier 

 

Compreender a estrutura de funcionamento da cadeia de valor do guaraná em Maués, analisar os custos de produção e a sua viabilidade financeira, além de identificar fortalezas e entraves são os desafios destacados por um estudo lançado hoje pela Aliança Guaraná de Maués (AGM), com o objetivo de propor melhorias ao setor e agregar mais valor ao produto.

Atualmente, Maués é o maior produtor de guaraná de origem da agricultura familiar no Estado do Amazonas, mas Presidente Figueiredo, nos últimos anos, se tornou o município que mais produz com a participação de uma grande empresa, com uma diferença de apenas três toneladas. Mesmo não sendo o objetivo central do estudo, os dados presentes no mesmo ajudam a entender como Maués “perdeu o posto” de maior produtor do Amazonas para outro município.

Pontos como a não utilização de práticas de manejo adequadas, falta de inovação nas práticas de acordo com a realidade do produtor, a forte presença da figura do atravessador, combinado com a falta de organização dos grupos de agricultores, foram identificados no levantamento, que chegou à conclusão que boa parte dos produtores opera em prejuízo na região.

O cenário presente no estudo “A Cadeia de Valor do Guaraná de Maués” — elaborado pela AGM em colaboração com os próprios produtores e demais envolvidos no segmento local — não foi totalmente animador: para todos os níveis de produção analisadas no estudo (guaraná de estaca/clonados ou semente) foi constatado um custo acima do preço de mercado, ou seja, os produtores da região operam em prejuízo.

Esta foi uma realidade percebida nas médias gerais das entrevistas aplicadas aos produtores, todas verificadas em oficinas participativas, mas contrapostas em estudos de caso que se aproximam mais da viabilidade econômica, provando que um dos principais problemas está no alto custo de produção com uma baixa produtividade por hectare.

Empregadas há anos pelos antepassados dos produtores tradicionais, a estrutura e técnicas utilizadas conferem um status mais artesanal ao produto mauesense, porém, com baixo índice de produtividade e de retorno aos próprios produtores. Um dos casos exemplificados no estudo ocorre no processo de despolpa após a fermentação, feito de forma precária, com técnicas de pisar nos frutos depositados no chão. Alguns agricultores que possuem maior produção investiram na despolpadora motorizada adaptada para o fruto do guaraná, mas estes casos ainda são exceções.

Outro custo que pesa no bolso do produtor está ligado diretamente à figura do atravessador e das questões logísticas inerentes a essa relação comercial. A semente torrada, que tem como destino a fabricação de refrigerantes, em sua maioria é comercializada para agroindústrias via atravessadores ou associação de produtores. Todo o transporte é bancado pelo produtor, com valor entre R$30 e R$200 por viagem, que ocorre por via fluvial.

A comercialização via intermediários é o principal canal de escoamento da produção, segundo 86% dos produtores entrevistados. De um modo geral, as empresas não estabelecem contratos de compra e venda com produtor, já que apenas 6% dos entrevistados disseram possuir algum tipo de acordo firmado.

Para a engenheira agrônoma e responsável pelo GT de Produção Sustentável da AGM, Laís Bentes, todas essas informações vão auxiliar nas medidas estratégicas e nas decisões que precisam ser tomadas para organizar cada vez mais o segmento do guaraná a partir de agora.

“Esses dados podem ajudar em diversos pontos da cadeia, seja na parte de tratos culturais, manejo da cultura, na produção, nas diferentes técnicas aplicadas ao guaraná ‘clonado’ ou semente, orgânicos ou não. O diagnóstico vai nos ajudar a ter uma visão melhor sobre organização social, ao associativismo e começar a despertar neles a busca por organização, acesso a novos mercados”, destaca Bentes.

O que pode ser feito

Os principais gargalos mencionados pelos produtores, como o baixo preço de venda do produto, o alto custo da produção, a dependência de intermediários e dificuldades de acessar mercados com preços diferenciados, são os pontos fundamentais que necessitam de ações mais diretas. O primeiro aspecto levantado pelo estudo trata da melhoria nas condições de compra e venda e repasse de preços ao produtor da semente torrada, através de uma maior rastreabilidade dos produtos comercializados via intermediário, procurando garantir que o preço pago ao produtor não seja inferior ao de produção.

O segundo aspecto diz respeito ao desenvolvimento do mercado do guaraná com valor agregado, fortalecendo organizações e empreendedores locais para comercializar o guaraná em pó, bastão ou outros derivados com mercado diferenciado.

Um exemplo positivo é a Associação dos Agricultores Familiares do Alto Urupadi (AAFAU), que já se organiza para acessar mercados internacionais com seu produto orgânico. A associação está em fase de captação de recurso para acessar a certificação e capital de giro. Além do apoio financeiro, ela busca suporte para entender as exigências do mercado, estabelecer plano de marketing e plano de negócios.

Secretária da AAFAU e produtora agrícola, Ednamar de Oliveira Viana afirmou que a dificuldade de acesso a diferentes mercados foi uma das motivações para o grupo se organizar e tentar a certificação. Ednamar confirma que a produção atual é escoada principalmente pelos intermediários, o que para ela não significa um mercado com preços justos. “Ficamos muito à mercê dos atravessadores, e com o guaraná atingindo preços mais baixos, ficamos sem condições de vender a um preço justo”, completa Ednamar.

Outro importante ponto recomendado no estudo é auxiliar os grupos produtivos a se inserirem em lógicas mais integradas de produção, como a valorização dos próprios Arranjos Produtivos Locais.

“Maués possui um importante e histórico arranjo produtivo que traz valorização da identidade local e renda aos agricultores familiares, mas está passando por um período crítico de transição e, de acordo com os agricultores está em colapso. Todos os elos da cadeia precisam pensar juntos ao agricultor familiar, a partir de uma visão compartilhada, coletiva e adequada à realidade dos produtores”, enfatiza Eric Brosler, coordenador técnico da AGM.

Sobre a AGM

A Aliança Guaraná de Maués é coordenada pelo Idesam, com apoio da Ambev e USAID, que são parceiros fundadores e financiadores da iniciativa. A AGM busca a valorização biocultural da região e também a melhoria na qualidade de vida da população mauesense, interagindo e construindo junto com os diversos atores locais.

Lançada em outubro de 2017, a Alianca vem realizando ações concretas por meio dos Grupos de Trabalho (GT) nas áreas de Educação, Produção Sustentável, Turismo e Produção Sociocultural, temas considerados pilares pelos participantes para o desenvolvimento sustentável e compartilhado do município e sua extensa área rural.

Link para acesso ao estudo completo.[:en]Coordinated by Idesam, the Maués Guaraná Alliance (AGM, for its name in Portuguese) raised data from various agents of the guaraná production chain – the iconic fruit from the state of Amazonas

 

Text and photo by Henrique Saunier
Translated by Felipe Sá

 

A study released today by the Maués Guaraná Alliance (AGM) has as its main goal to improve the sector, adding more value to the product. It highlights some challenges linke: understanding the functioning structure of the guaraná value chain in Maués, analyzing production costs and its financial viability, and identifying strengths and obstacles.

Today, Maués is the largest producer of guaraná from family-based agriculture in the state of Amazonas. In the past years Presidente Figueiredo became the top producer in absolute numbers, with a small difference of three tons. Even though this is not key to the study, it helps understanding how Maués “lost the lead” to another municipality.

The research identified that little modernized techniques and strong presence of middlemen combined with the logistic cost make producers from the region to run at a loss.

The landscape presented in the study “The Value Chain of the Guaraná from Maués” (“A Cadeia de Valor do Guaraná de Maués”, in Portuguese) – carried out by the AGM in collaboration with the producers themselves and others engaged in the local segment – was not exactly uplifting: all the production levels that were analyzed (cloned and native guaraná) pointed to expenses that are above market prices, what means that the producers have financial loss. This was a reality noticed in the general averages of the interviews applied to the producers, all verified in participatory workshops.

The structure and techniques used by traditional producers are exactly the ones their ancestors used, what makes the product from Maués more artisanal, but with lower productivity and also lower revenue to the producers. One of the cases exemplified in the study is the fermentation process of the guaraná fruits, which are arranged on the floor (masonry floor or plastic canvas), in raffia bags or in a structure called “gareira”.

After the fermentation, the pulp is removed, what is done in a precarious way, treading the fruits placed on the ground. Some farmers with larger productions invested in an adapted motorized machine that removes the guaraná pulp, but these are still exceptions.

Another cost that weighs on the producer’s pocket is directly linked to middlemen and logistics, inherent to this commercial relationship. The toasted seed, which is destined to the soda industry, is mostly marketed to agroindustries via middlemen and producers’ association. The producer pays all transportation expenses, what can cost from R$30 to R$200 per trip by inland waterway or land (in the case of a few properties that have access to the road).

The commerce via middlemen is the main way of distributing the production according to 86% of the interviewed producers. In general, companies don’t close purchase and sale agreements with producers, since only 6% of those who were interviewed told that they have some sort of agreement made.

For Laís Bentes, agronomist and responsible for the AGM Sustainable Production Working Group, all this information will contribute in the strategic measures and decisions that need to be made to organize the guaraná segment from now on.

“These data can help at various points along the chain, whether in the area of crop treatment and management, production, or the different techniques applied to ‘cloned’ or organic guaraná. The diagnosis will help us having a better view on social organization, associativism and to start awakening in them the will for organization, accessing new markets”, Bentes highlights.

What can be done

 The main choke points mentioned by the producers, such as low selling price, high production costs, dependence of intermediaries and difficulties to access markets with differentiated prices, are fundamental points that need to be more directly tackled. The first aspect raised by the study is about improvement of the conditions of purchase and sale and transfer of prices to the producer of toasted seeds through a greater traceability of the products traded by intermediaries, trying to ensure that the price paid to the producer is not inferior to that of production.

The second aspect concerns the development of the value-added guaraná market, strengthening local organizations and entrepreneurs to market the fruit in powder, cane or other by-products to a differentiated market.

The Association of Family Farmers of Alto Urupadí (AAFAU) is a positive example which is already organized to access international markets with its organic product. The association is currently raising funds to get certified and access working capital. In addition to financial support, it seeks help to better understand the market requirements and to establish a market and business plan.

Ednamar de Oliveira Viana, secretary of the AAFAU and also agricultural producer, said that the difficulty faced when trying to access different markets was one of the motivations for the group to get organized and try getting certified. Ednamar confirms that the current production is mainly sold by intermediaries what, in her opinion, doesn’t mean a fair market. “We are too dependent on middlemen, and with guaraná reaching lower prices, there are no conditions to sell at a fair price”, she completes.

Another important item recommended in the study is to help productive groups to insert themselves into more integrated logics of production, such as the valorization of Local Productive Arrangements themselves.

“Maués has an important and historic productive arrangement that values local identity and generates income to family farmers, but is undergoing a critical period of transition and, according to farmers, is collapsing. All links in the chain need to think together with the family farmer, from a shared, collective and appropriate vision to the reality of producers”, emphasizes Eric Brosler, technical coordinator of the AGM.

About AGM

 The Maués Guaraná Alliance is coordinated by Idesam, with the support of Ambev and USAID – founding partners and funders of the initiative. The AGM seeks the biocultural valorization of the region and also to improve the quality of life in Maués, interacting and building together with the various local actors.

Launched in October 2017, the Alliance has been carrying out concrete actions through the Working Groups in Education, Sustainable Production, Tourism and Socio-Cultural Production. These themes are considered cornerstones by the participants for a sustainable and shared development of the municipality and its extensive rural area.[:]

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